Entre relatos e brincadeiras

Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa se encerra na UFMG com a realização de Seminário Final em dezembro


     

Acontece • Quinta-feira, 17 de Dezembro de 2015, 17:27:00

Um casamento de três anos: assim Isabel Frade, diretora do Ceale, definiu o relacionamento dos envolvidos com o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic), na abertura do Seminário Final de 2015. “Nós criamos intimidade uns com os outros”, afirmou a diretora. Em seu relato, Adriana Mota e Jerusa Silva, representantes da Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, expuseram os desafios da gestão do Pacto no município. “Só compreendemos o Pnaic quando começou”, afirmou Jerusa. Elas abordaram o que acreditam ser diferenciais da gestão em Belo Horizonte, como os trabalhos que vêm sendo feitos para buscar um acesso maior aos professores e à coordenação pedagógica das escolas, e para conscientizar as diretorias das instituições sobre a proposta do Pacto.

Novos caminhos

Quatro dos relatos de experiência de professoras na parte da manhã deixaram clara uma mesma certeza: a descoberta de novas possibilidades estimuladas pelo Pnaic. A professora Marília Siqueira, de Divinópolis, contou que o projeto apresentado partiu da angústia de como corrigir o texto de seus alunos. “Como fazer com que eles fossem protagonistas dos seus erros, tivessem autonomia sobre os próprios erros?”, questionou. Marília encontrou a solução na sequência didática, e escolheu para isso livros de imagem fornecidos pelo Pnaic. Marília acredita que, com ajuda do processo de sequência didática, deu protagonismo aos seus alunos. “Eu me realizei, a sequência didática na minha vida profissional foi um corte paradigmático”, afirma.

A professora Amanda Cristina Delfino, de Ibirité, que apresentou com seus alunos a peça de teatro O Quebra-Nozes durante o evento, contou que se, antes, seu projeto era “apenas” o de elaborar a peça, com os materiais do Pnaic ela refletiu sobre sua prática pedagógica, ampliando, assim, a proposta inicial. No projeto, Amanda contou que se preocupou com o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita, do letramento das crianças e da capacidade oral. “Eu vejo uma importância de contar histórias, de envolver as crianças nesse mundo literário”, defendeu.

Outro relato que reforçou a valorização de novas possibilidades foi o da professora Elza Saraiva, de Juatuba, com o tema “A importância da interdisciplinaridade no processo de aprendizagem”. O que começou com um passeio pelos arredores da escola, explorando com os alunos as plantas que eles viam, culminou em várias atividades envolvendo a planta do feijão – a que chamou mais atenção das crianças, segundo Elza. Dentro da temática, a turma trabalhou desde operações matemáticas como contagem, até a leitura de João e o pé de feijão. “É pouco tempo para relatar o desenvolvimento, assim, excelente, que foi feito com meus alunos”, disse.

A preocupação em desenvolver novas competências também estava presente no relato da professora Maria Aline Mendes, da Escola Municipal Levindo Mariano, de Ipatinga. A professora desenvolveu com sua turma o projeto “Poupar ou Gastar: o que Ipatinga tem a ganhar”, para abordar o tema da educação financeira. “Foi um projeto no qual eu procurei envolver as famílias, buscando uma conscientização, para as crianças também colaborarem no orçamento familiar”, explicou. Na primeira etapa, Maria Aline criou a personagem “Dinherilda” para contar a história do dinheiro e sua importância. Depois, a professora organizou um supermercado na escola e, por fim, trabalhou com os alunos a importância do imposto e sua ligação com o patrimônio público, utilizando o site Leãozinho, da Receita Federal.

Brincar também é coisa séria

“Eu vim no improviso. Se eu quebrar a cara, vou continuar feliz. Mas eu não vou, porque a arte alimenta a alma”, disse Maria Norma Sales, contadora de histórias, em sua apresentação, uma das atrações culturais da manhã. Maria Norma contou a história de Lilith, primeira esposa de Adão, interpretou a canção “Era Uma Vez” e convidou as professoras presentes para dançar no palco.

Esse estímulo à descontração com as professoras é uma preocupação fundamental do trabalho realizado por Gisélia Maria Leite, de Sete Lagoas. Em seu relato de experiência, Gisélia contou que, a partir da socialização com professoras sobre as memórias de suas brincadeiras da infância, foram feitas reflexões sobre a brincadeira no espaço escolar. Uma das cursistas do Pnaic, contou Gisélia, disse que “geralmente os gestores encaram a brincadeira como bagunça, mas, após o início do Pnaic, muitos já estão aceitando melhor o brincar na escola”.

A professora e atriz Aline Marciana Malverde, que participou da roda organizada por Maria Norma, tocou em uma questão muitas vezes negligenciada nas escolas em seu relato: respeito à diversidade. “Eu passei a infância toda ouvindo que meu cabelo era duro, cabelo de bombril. Minha irmã, que nos anos 70 entra pro movimento hippie, ela me fez me empoderar e eu queria ser minha irmã na vida desses alunos”, conta Aline. A partir dessa vontade, fez pesquisas e encontrou projetos como o Pixaim, que promove valorização da cultura negra, e pessoas como a MC Soffia, uma rapper de 11 anos, que versa sobre temas como racismo, trazendo para a sala de aula esses materiais. Aline também desenvolveu um ensaio fotográfico valorizando as crianças que têm cabelo crespo. “Essa vivência estética e artística trouxe reflexões para contribuir para uma mudança de concepções, criando questionamentos sobre valores estéticos hegemônicos na nossa sociedade”, afirmou.