Literatura em tempos digitais

Encontro de setembro do Leituras em Conexão aborda experiência literária na contemporaneidade


     

Acontece • Sábado, 15 de Setembro de 2018, 16:03:00

 
Hoje ocorreu, na parte da manhã, mais um encontro do Leituras em Conexão. O curso para formação de articuladores de leitura, voltado para professores da rede pública e bibliotecários, ocorre concomitantemente em oito escolas públicas de Belo Horizonte e na Secretaria Municipal de Educação (SMED) da capital mineira, contemplando as nove regionais da capital.
 
Fomos desta vez acompanhar as discussões na Escola Municipal Francisco Magalhães Gomes, na região norte da capital. A professora da regional é a coordenadora e professora do curso de Pedagogia do Centro Universitário Estácio de Belo Horizonte Fernanda Pereira. 
 
O encontro de setembro foi voltado para abordar a questão da experiência literária na sociedade atual. Antes de discutir as novas formas de leitura e escrita atuais, Fernanda levantou questões para as professoras refletirem, perguntando quando foi a última vez que elas escreveram uma carta e pagaram uma conta com cheque e se seus alunos escrevem com letra cursiva.
 
Depois, perguntou de que modo a experiência literária dos alunos das cursistas é diferente da delas. Uma das professoras levantou a diferença de suportes e a mudança da cultura de obrigatoriedade de leituras escolhidas pelos professores. Outra professora externou sua preocupação com as escolhas dos alunos, que “só escolhem entretenimento”. Tanto Fernanda quanto as cursistas concordaram que a função do professor deve ser a equilibrar entre a obrigatoriedade e a liberdade. Uma das professoras contou que usa a estratégia de “fechar no autor” as escolhas dos alunos, para driblar a falta de liberdade total.
 
Novas tecnologias, novas leituras
 
Outra pergunta que Fernanda levantou foi “de que maneira as leitura para os jovens está ligada às tecnologias digitais?”, para começar a discutir as transformações trazidas pelas tecnologias digitais. “Queremos que eles façam do jeito que fizemos: pesquisa no livro”, chamou atenção uma das cursistas.
 
Fernanda então comparou a escola tradicional com a escola nos tempos atuais, destacando que o professor antigamente era o detentor do conhecimento e tinha a função de transmitir conhecimento. Como hoje há o conteúdo “dado”, já que é fácil obter informação em diversos lugares, Fernanda questionou qual é a função do professor hoje.
 
Para Fernanda, o professor hoje tem uma tarefa muito mais difícil, que é realizar uma “rede de conexão” entre as informações, questionando, articulando e problematizando os conteúdos. As cursistas também acrescentaram a função de ajudar o aluno a filtrar as informações, indicando fontes confiáveis. Fernanda complementou com a tarefa de propor ao aluno o exercício de investigação das informações.
 
Características da contemporaneidade
 
Para discutir como se pode ensinar literatura na sociedade atual, a professora Fernanda apresentou antes cinco características da sociedade atual importantes para se pensar na questão: predomínio da tela sobre o papel; predomínio da simultaneidade sobre a sequencialidade; obsolescência tecnológica; convergência e multiplicidade de meios; e interatividade.
 
Os textos atualmente estão mais parecidos com nosso esquema mental, apontou Fernanda, já que no espaço digital as informações são simultâneas e sem ordem lógica, como nossos pensamentos, enquanto que os textos em papel seguem uma esquematização e uma sequência lógica. Inclusive na escrita, há mais liberdade no meio digital, permitindo ao escritor soltar as informações para depois organizá-las, e já no papel havia há limitação de não poder errar na máquina de escrever, pois não havia a opção deletar o texto. Nos textos no papel, há uma sequencialidade e linearidade das informações.
 
Além disso, com a convergência de mídias e novos meios, ficou mais evidente que não só o texto verbal, mas as imagens, sons, cores e outros elementos produzem sentido, sendo um desafio atual trabalhar com essas informações diferentes. Também soma-se ao desafio a questão da interatividade, que também ficou mais evidente, mesmo havendo artistas, como Lygia Clark, que já propunham bem antes da era digital experimentações interativas.
 
Após a apresentação das características, Fernanda exibiu vídeos de livros literários com a inserção de músicas. As páginas dos livros eram filmadas e passadas no vídeo. Os dois livros, “A flor do lado de lá” e “Onda”, contêm apenas imagens, ou seja, são narrativas sem texto verbal. A professora mostrou os vídeos para discutir com as cursistas as diferenças de experiência e interpretação que podem ser geradas a partir de modos diferentes de apresentação da narrativa. Ela valorizou a riqueza interpretativa dos livros de imagem, que provocam a construção de interpretações, já que não há informações dadas e permitem a elaboração de diversos sentidos. 
 
Novos conceitos
 
“Como se dá a formação do leitor agora?”, Fernanda questionou. Pontuando que o leitor agora deve ter domínio de vários códigos, a professora afirmou que é necessário repensar a ideia “literatura = livro”, propondo que se busque ensinar a ler a palavra e não apenas o livro.
 
Por fim, Fernanda trouxe os conceitos de multimodalidade. Saiba mais sobre no Glossário do Ceale: multimodalidade
 
O projeto
 
O Leituras em Conexão: Formação de articuladores de leitura das Escolas Municipais de Belo Horizonte é um projeto da Secretaria Municipal de Educação (SMED) de Belo Horizonte desenvolvido em parceria com o Ceale.
 
A proposta surgiu a partir da percepção da necessidade de um melhor preparo dos professores para trabalharem com os livros disponíveis nas bibliotecas das escolas da rede pública. Com isso, a intenção é apoiar políticas públicas de incentivo à leitura, levando ao conhecimento dos educadores os projetos na literatura que estão em vigor e tudo o que o governo oferece em termos de material de apoio para o ensino literário, como as bibliotecas e acervos de livros.
 
O curso pretende abordar o planejamento de ações para incentivar a leitura nas bibliotecas escolares, o melhor aproveitamento dos acervos literários, além de oficinas de leitura, abordando fundamentação teórica e a prática também. Ao final do curso, os projetos desenvolvidos serão expostos em local público e compartilhados em redes.
 
Livros infantis sugeridos no encontro
 
É um livro, de Lane Smith
 
Duplo Duplo, de Menena Cottin
 
A flor do lado de lá, de Roger Mello
 
Onda, de Suzy Lee