< ir para página inicial

Reescrita

Autor: Raquel Salek Fiad,

Instituição: Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP / Instituto de Estudos da Linguagem-IEL,

O termo reescrita deve ser entendido no interior de uma concepção de escrita como um processo, diferente de uma concepção de escrita apenas como um produto. Quando perguntamos “o que é escrever?” ou “como acontece a escrita?”, uma resposta corrente e banal remete aos conceitos do dom e da inspiração, ou seja, escreve-se quando se tem o dom para escrever e quando se tem inspiração para escrever. Outra resposta, mais embasada em estudos e pesquisas, e possível de ser levada para a prática pedagógica, diz que a escrita é resultado de um trabalho realizado pelos escreventes, seja na escola, seja nas diferentes situações sociais em que acontece.

A concepção de escrita como um processo baseia-se nas teorias da enunciação que consideram a língua um fenômeno social, uma forma de ação entre sujeitos. Ao escrever – e também ao falar –, os sujeitos constroem uma interação em que o trabalho com a língua está presente.

Nas situações de uso oral da linguagem, o trabalho com a língua também existe, mas não fica registrado. É na escrita que a oportunidade de retomada e exploração dos recursos linguísticos é frequente e pode ser trabalhada pedagogicamente.

Pode-se, então, caracterizar a reescrita como as retomadas que são feitas no texto e que nele produzem  alguma alteração, que pode ser desde uma pequena correção, como questões de convenções ortográficas, até alterações que mudam o significado do texto.

É difícil imaginar a escrita sem a reescrita. Quando a criança começa a escrever, as rasuras que ficam em seu texto são marcas dessa atividade. Do mesmo modo, rascunhos de textos que depois são finalizados e publicados também mostram a atividade processual de reescrever.

No contexto pedagógico, o olhar tradicional para as rasuras é um olhar de reprovação, pois associa a reescrita ao erro e ao desconhecimento por parte do escrevente. No entanto, as rasuras indicam as reflexões que o escrevente está realizando sobre a língua e que ficaram marcadas no texto escrito. Nessa perspectiva, as rasuras permitem que se saiba um pouco do que a criança conhece sobre a língua escrita, suas dúvidas e dificuldades no momento da produção de um texto.

Embora a reescrita aconteça espontaneamente na produção escrita escolar, é importante que ela seja entendida como um componente do ensino da escrita. Cabe ao professor, como interlocutor privilegiado dos alunos, provocar a reescrita dos textos, seja pelos próprios autores, seja pelos colegas. Nesse movimento, a reescrita não é apenas uma correção dos problemas existentes nos textos, mas é necessária, em função das condições de produção dos textos: reescrever implica considerar se o texto está adequado aos objetivos do produtor, aos interlocutores, às condições de circulação do texto.


Verbetes associados: Condições de produção do texto, Convenções ortográficas, Enunciação / enunciado, Interação verbal, Texto, Retextualização, Produção de textos


Referências bibliográficas:
FIAD, R. S.; MAYRINK-SABINSON, M. L. T. A escrita como trabalho. In: MARTINS, M. H. (Org.). Questões de linguagem. São Paulo: Contexto, 1993.
FRANCHI, C. Criatividade e gramática. In: Trabalhos em Linguística Aplicada. Campinas: Unicamp/ IEL, n. 9, p.5-45, 1987.
GERALDI, J. W. Portos de Passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
GERALDI, J. W. O professor como leitor do texto do aluno. In: MARTINS, M. H. (Org.). Questões de linguagem. São Paulo: Contexto, 1993.

< voltar