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Fonologia

Autor: Ana Ruth Moresco Miranda,

Instituição: Universidade Federal de Pelotas /Grupo de Estudos sobre Aquisição da Linguagem Escrita (GEALE),

Fonologia é a área da Linguística que estuda a gramática dos sons, isto é, o sistema de sons da língua. À fonologia cabe descrever os fonemas, as regras de combinação dos sons para formarem unidades maiores, tais como a sílaba e as regras de atribuição do acento prosódico. Ao estudar os segmentos (as consoantes e as vogais), a fonologia interessa-se pelo valor que tais unidades linguísticas assumem em relação a outras no interior de um mesmo sistema, ou seja, interessa-se pelo que é funcional na língua: o fonema. O fonema é uma unidade que possui valor contrastivo e é, portanto, capaz de distinguir significado. Para verificarmos o valor contrastivo de um segmento, utilizamos o princípio da comutação, que consiste na comparação entre pares mínimos, isto é, duas palavras da língua que diferem em seu significado apenas por um segmento. Se tomarmos como exemplo um par mínimo do português como pato e bato, podemos observar que a simples substituição do elemento inicial resulta em mudança de significado e consequentemente na configuração de uma nova palavra. Esses exemplos permitem-nos observar claramente o valor contrastivo das consoantes /p/ e /b/, as quais, ao serem substituídas uma pela outra, geram novos itens lexicais. Por meio da comutação dessas consoantes, podemos concluir, então, que /p/ e /b/, mais do que simples unidades de sons do português, representam fonemas da língua. O mesmo procedimento aplicado a todos os sons mostra que o sistema do português é composto por dezenove consoantes e sete vogais. Os fonemas, por seu caráter contrastivo e, portanto, invariável, estão na base dos sistemas de escrita alfabética e, no caso do português, orientam as relações entre os níveis fônico e gráfico no sistema ortográfico da língua.

O conceito de classe natural é importante para a compreensão do funcionamento dos sons em um dado sistema linguístico. A ideia é a de que sons semelhantes se agrupam formando classes que, por compartilharem características comuns, funcionam de modo semelhante. Tal noção ajuda a elucidar o modo como processos fonológicos, tais como os de substituição e assimilação, atuam na língua. Os processos de substituição observados na aquisição da linguagem, por exemplo, envolvem sempre segmentos que pertencem à mesma classe natural. Se a criança não é capaz de produzir o /r/, por exemplo, coloca em seu lugar um /l/ e nunca um /p/, porque  /r/ e /l/ pertencem à classe das consoantes líquidas, enquanto /p/ é uma consoante plosiva que não compartilha com as líquidas característica alguma. Se a vogal for modificada por um processo assimilatório, em razão de outra vogal vizinha, a mudança é previsível e irá ocorrer entre o grupo de vogais que compartilham traços e pertencem à mesma classe. Um exemplo de assimilação entre vogais muito comum nos dados do português é a pronúncia de “cumida” para a palavra comida, em que o “o” passa para “u” por influência do “i” da sílaba tônica. Graças à noção de classe natural, é possível entender o motivo por que os sons mudam de forma previsível. Não encontramos trocas na língua, na variação e tampouco na aquisição da linguagem, em que um [p] seja substituído por um [l] ou um [a] por um [i], por exemplo.  

A sílaba é a unidade fonológica maior que o segmento e deriva do agrupamento de sons que se organizam para formar estruturas maiores. Os estudos fonológicos referentes à sílaba do português mostram que as consoantes (C) se agrupam em torno de uma vogal núcleo (V) para gerar sílabas bem formadas. É importante ressaltar a diferença entre a sílaba fônica e a sílaba gráfica. Enquanto esta pertence ao âmbito da ortografia, aquela diz respeito à fonologia. A relação entre ambas não é isomórfica, por isso uma sílaba fônica pode ou não corresponder a uma sílaba gráfica: duas sílabas fônicas podem corresponder a uma gráfica (dizemos a.di.vo.ga.do e ri.ti.mo, mas dividimos graficamente essas palavras como ad-vo-ga-do e rit-mo) ou duas sílabas gráficas, a uma fônica (temos a-bó-bo-ra e fós-fo-ro, na escrita, mas podemos ter a.bo.bra e fos.fro, na pronúncia). 


Verbetes associados: Consoantes, Correspondência grafofonêmica, Fala, Fonema, Palavra canônica, Sílaba, Sistema Fonológico, Vogais


Referências bibliográficas:
BISOL, L.(org.). Introdução a Estudos de Fonologia do Português Brasileiro. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1999.
CRYSTAL, D. Dicionário de Linguística e Fonética, Rio de Janeiro: Zahar, 1988.
MIRANDA, A.R.M.; MATZENAUER, C. L. B. Aquisição da fala e da escrita: relações com a fonologia. Cadernos de Educação (UFPel), v. 35, 2010. p. 359-405.

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